MI PADRE
Meu pai sempre de chapéu de aba larga já meio surrado. Os debochados diziam que o chapéu grande era para KH ar na sombra. Bombacha larga e chinela alpargatas. Dia de chuva gostava de ir jogar truco, uma variante do Poker, no bolicho do Seu Lino. Dia de carreiradas nos lustrávamos suas botas de cano longo e lá se ia ele de botas, lenço branco no pescoço e um extrato (perfume) marca “Amor Gaúcho” no cabelo. E o seu melhor chapéu de aba larga.Meu pai, Oralvino, teve uma infância difícil. Ficou órfão ainda menino. Ele e seus irmãos tiveram de trabalhar duro na lavoura para tirar o sustento. Era respeitado no rincão, tinha pertencido a uma antiga polícia, alguns o apelidavam de comissário. Contava-nos, que um comissário de polícia no Uruguai, analfabeto, interpelou um viajante pedindo-lhe documentos, estes não possuíam fotos, ele sem saber ler segurou o documento virado e fingia que lia ao que o viajante observou que o papel estava virado. O comissário o fitou brabo e sério e falou: “La policia lê como bien le parece” Tinha um 38 (como é chamado o revolver) cromado, mais velho que andar de a pé, que ficava sempre dentro do coldre preto enrolado na guaiaca preta desbotada (mais usada que baralho de presídio) em cima do criado mudo. Era tabu, nenhuma criança chegava perto. Possuía um rifle de cavalaria (mosquetão) que ganhou do finado Maneco, um revolver antigo, Nagão 44 de tramela e uma espada antiga. Dizia um causo sucedido, dois indivíduos levaram um outro para o matarem em lugar ermo, no momento que precedeu o assassinato dois quero-queros sobrevoaram a cena, e a vítima olhou para eles e disse, vocês são meus testemunhos! E o crime se consumou sem que se descobrissem os culpados. Algum tempo depois estavam os culpados numa reunião de carreira e dois quero-queros os sobrevoaram, ao que um deles falou em voz alta, olha lá! Os testemunhos do fulano! (sua vítima). Acontece que alguém os ouviu e falou para a policia que os interrogou e eles confessaram o crime. Como diz o GAGAIO genro do meu cunhado Fêliz, ante seus cuentoss em profusão, dizia: O seu Fêliz tem muitas historias, mas não podem ser confirmadas pois os protagonistas são todos finados. Meu pai Oralvino era um sujeito muito sério, mas, ao mesmo tempo brincalhão com os filhos. Sempre fazendo seus trocadilhos e versinhos de humor, e trocando o nome das coisas por gírias engraçadas. Lembro uma Sexta-feira Santa, naquele tempo havia normalmente uma série de (não presta). Não presta isto, não presta aquilo, etc. A sexta-feira santa era de muita vigília. A cena era na beira do fogão onde o velho tomava mate com mamãe, com a gurizada na volta aprontando. O velho foi dar uma reprimenda e seu senso de humor não o conteve, disse, olha que hoje não é permitido bater em filho ( na verdade nunca apanhamos) mas espeto quente pode encostar na pele do faltoso. Tinha o costume de estar sempre mexendo no fogo do fogão, arrancando pequenas lascas das astilhas de lenha e jogando na fornalha. Tinha a sua sabedoria em forma de ditados.Quando se aproveitavam da fragilidade de alguém ele dizia:Touro magro todo mundo piala!
E outras:
Não se elogia o burro antes de passar o barro.]
Praga de Urubú não cai em cavalo gordo.
Boi lerdo bebe água suja.
Burro dado não se olha o pêlo.
Filho de tigre sai pintado.
E uma porção de outros.
Na próxima sexta-feira, segue mais recordações de um doble chapa.
Até a próxima se Deus quiser...
Anajá Schmitz