AS ORIGENS
Nelci CordeiroDoble chapa é uma gíria que identifica o sujeito cujos pais são um brasileiro e outro uruguaio, por extensão é chamado todo aquele que nasce na fronteira oeste do RS. A expressão doble chapa veio dos automóveis em Livramento-RS, que para circular em Rivera no Uruguai, e vice versa, cidades separadas apenas por uma rua que é linha divisória dos dois países, tinham que ter as duas placas. Os uruguaios os chamavam de Doble chapa.Sou filho de pai brasileiro e hijo de madre oriental. Diz a música nativista. Uma castelhana de Minas de Corrales – Uruguay. O pai de minha mãe, veio para o Brasil para trabalhar de chacareiro de uma fazenda. Ela e seus irmãos ajudavam no cultivo. Na colheita do milho, as mulheres guardavam as palhas mais sedosas e a noite as aparava e formava maços os quais trocavam por cortes de vestido de chita com o Mascate, para ir aos bailes, umas das poucas maneiras dos jovens se conhecerem e casarem. Sem gastar nada com hospedagem o mascate (Vendedor ambulante com uma carroça normalmente puxado por mulas) ia de propriedade em propriedade vendendo sua mercadoria. Dai o ditado (mais viajado que cachorro de mascate) Obs. ninguém cobrava alimentação de um viajante na campanha gaúcha. Os Sírios Libaneses enriqueceram vendendo roupas aos camponeses. Certa feita chegou um desses na nossa casa com duas malas enormes, a pé, e começou uma chuva que durou uma semana e ele ficou hospedado de graça por todo esse tempo.Na estância de Dom Leopoldo Schilling onde eu também acabei casando, casou-se a Castelhana com Dom Oralvino Machado Cordeiro natural do Rincão dos Cordeiros, 3º distrito de Livramento, dito Rincão, tinha esse nome porque todo mundo era parente ou aparentado, até hoje existe um colégio estadual onde a maioria absoluta dos alunos era desse sobrenome. Certa feita um piá que começava a aprender geografia, perguntou ao pai gaudério onde ficava o Rio Grande do Sul, ele respondeu que eram aquelas terras ao redor do Rincão. No horário de aula via-se a cavalhada dos alunos amarrada no aramado. Meus 4 irmãos mais velhos iam cada um com seu cavalo, como não sobrava cavalo manso pra mim, eu estudava em casa com minhas irmãs. O colégio ficava em uma área de terra a beira da estrada municipal, inserida nas terras da dita fazenda do Sr Leopoldo Schilling, que doou o local para construção da escola. As professoras eram moças, as vezes rapazes com um bom desempenho escolar. Contratadas pelo município para o magistério rural. Hospedada gratuitamente na casa de um dos alunos. Em Osório-RS, encontrei o professor Turíbio (bom na gaita de boca) formado na Escola Rural e mandado para aquele fim de mundo, mas guardava gratas lembranças dos bailes que meu tio Mindongo fazia, onde se hospedara nas cercanias do Colégio, morreu velho sempre comentando sua passagem pelo Rincão dos Cordeiros.
Na próxima sexta-feira, segue mais recordações de um doble chapa.
Fronteira entre Livramento-RS e Rivera-Uruguai
Rivera
Até a próxima se Deus quiser...
Anajá Schmitz