OS CAVALOS
Toda pessoa possuía um cavalo para se deslocar, por mais pobre que fosse, da mesma maneira que todo sujeito por mais pobre possui ao menos uma bicicleta. Possuir carroça de cavalo ou ainda charrete equivalia a ser proprietário de um automóvel nos anos 70. Os cavalos de nossa propriedade eram a RAPINA, uma égua alazã que foi parelheira de corrida. Até hoje não entendo como podia ser boa de pata com aqueles cascos do tamanho de uma frigideira. O DOURADO, de pelo avermelhado, ambos de montaria do velho, o Dourado eu não gostava de andar, se assustasse de uma plantinha na relva e você não estivesse firme no lombilho (arrêlho, encilha), ele fazia uma repentina curva e deixava você montado no ar. A MARCHADEIRA era uma égua bonita mas tinha uma rendidura na genitália de onde saiam barulhos estranhos e muitos puns. Hiper mansa, era a que se pegava para trazer os demais cavalos, para trazer as vacas para encerrar os terneiros, arrastar água da cacimba numa forquilha com um barril. A RATA pequena, feiinha, barriguda. A LUBUNA pequena, lerda era também de prender na charrete. O velho saia com ela na charrete e cada um que encontrasse na estrada parava para conversar, todos se conheciam, só que ela pegou o embalo de parar sempre que defrontava alguém na estrada e isso nos constrangia, pois a pessoa acreditava que nós lhe queríamos lhe dirigir a palavra. A égua do Juracy, irmão mais velho, era a que todos queriam montar, ágil e voluntariosa. Tinha ainda um TORDILHO negociado com o vizinho Apuleu, tinha o cômodo horrível como o de um camelo. A cavalhada gostava muito de comer grama no alagado do açude, as vezes saim de lá cheios de sanguessugas nas pernas. O açude nunca secou em nenhuma estiagem, era bebedouro dos animais, onde se lavava a roupa, e pescava-se uma o outra traíra cuja cabeça era a parte predileta do velho, feita com molho ele a desmontava chupando cada um da infinidade de ossinhos. Dia de banhar o gado, era aquela discussão da gurizada cada qual queria os melhores arreios e o melhor cavalo. Afinal juntávamos o gado para levar no banheiro da fazenda do Sr. LEOPOLDO SCHILING, lá aonde minha mãe casou e eu acabei também casando com a filha de um capataz. Um velho mais sério do que capincho (capivara), tinha 7 filhas e 7 filhos, uma delas devia ser bruxa e um deles lobisomem pela crendice popular. Ainda bem que a minha companheira só usa vassoura para varrer. Quando eu era bem pequeno nossos cães eram o Paraná e o Sultão, ambos cuscos pequenos, ao morrerem, surgiu o Respeito um ovelheiro branco com coleira preta, tipo aqueles cães que os fazendeiros americanos fazem competição entre os mais inteligentes. E de fato era inteligente. Sempre que papai nos mandava juntar as ovelhas, ele se adiantava as ordens e fazia isso sozinho. Parecia que entendia a linguagem humana.